Há mais de um século, a amamentação vem sendo tratada, no Brasil, como uma questão feminina de interesse social e passível de intervenção pelo Estado. Tal realidade não é exclusividade brasileira. Em 1990, 30 países assinaram a Declaração de Innocenti (OMS/Unicef), carta de intenções na qual se comprometiam a estimular a conscientização das mulheres sobre a prática por meio da formulação de políticas nacionais de aleitamento materno e de outras estratégias. Na Europa, Estados Unidos e Canadá, a discussão teórica sobre os dilemas contemporâneos sobre alimentação infantil tem demonstrado bastante fôlego e pode ser traduzida no debate breast versus bottle feeding. No Brasil, embora os discursos oficiais sobre aleitamento materno continuem a atrelar o cuidado com o bebê à amamentação, reforçando a ideia da mãe como responsável insubstituível por essa esfera da vida familiar e social, a discussão carece de maior aprofundamento, sobretudo numa perspectiva de gênero. Este paper problematiza, portanto, o que há de socialmente construído nessas “leis naturais”. O corpus analisado reuniu artigos publicados a partir de 2000 em fontes diversas (Scielo, Wiley Online Library, International Breastfeeding Journal, entre outras) e revelou interessantes apropriações da amamentação: como direito que se realiza por meio da retomada do controle da mulher sobre seu corpo; dever moral da mulher para com a nação; e elemento de responsabilização total da mãe pela saúde dos filhos, indicando uma visão predominantemente crítica em relação aos discursos hegemônicos acerca do tema. Acreditamos na importância da contribuição teórica elencada neste trabalho e em sua possível apropriação por pesquisadoras(es) brasileiras(os) envolvidas(os) no debate.
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Kalil, I. R., & Costa, M. C. da. (2013). Entre o direito, o dever e o risco: olhares de gênero sobre amamentação. Revista Percursos, 14(27), 7–32. https://doi.org/10.5965/1984724614272013007
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