A difícil tarefa de definir quem é negro no Brasil

  • Munanga K
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Abstract

ESTUDOS AVANÇADOS 18 (50), 2004 52 de continuar seus estudos. Defendeu sua tese em 1977. No mesmo ano, voltou a seu país, mas não conseguiu permanecer lá por muito tempo. Regressou ao Brasil em 1979, para trabalhar na Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Em 1980, iniciou a segunda fase de sua carreira na USP. Em 2002, o governo brasileiro concedeu a Kabengele Munanga o diploma de sua admissão na Ordem do Mérito Cultural, na classe de Comendador. Participaram da entrevista com Kabengele Munanga, o editor de ESTUDOS AVANÇADOS, professor Alfredo Bosi, e o editor assistente, jornalista Dario Luis Borelli. ESTUDOS AVANÇADOS – Quem é negro no Brasil? É um problema de identidade ou de denominação? Kabengele Munanga – Parece simples definir quem é negro no Brasil. Mas, num país que desenvolveu o desejo de branqueamento, não é fácil apresentar uma definição de quem é negro ou não. Há pessoas negras que introjetaram o ideal de branqueamento e não se consideram como negras. Assim, a questão da identidade do negro é um processo doloroso. Os conceitos de negro e de branco têm um fundamento etno-semântico, político e ideológico, mas não um conteúdo biológico. Politicamente, os que atuam nos movimentos negros organizados qualificam como negra qualquer pessoa que tenha essa aparência. É uma quali-ficação política que se aproxima da definição norte-americana. Nos EUA não existe pardo, mulato ou mestiço e qualquer descendente de negro pode simples-mente se apresentar como negro. Portanto, por mais que tenha uma aparência de branco, a pessoa pode se declarar como negro. No contexto atual, no Brasil a questão é problemática, porque, quando se colocam em foco políticas de ações afirmativas – cotas, por exemplo –, o conceito de negro torna-se complexo. Entra em jogo também o conceito de afro-des-cendente, forjado pelos próprios negros na busca da unidade com os mestiços. Com os estudos da genética, por meio da biologia molecular, mostrando que muitos brasileiros aparentemente brancos trazem marcadores genéticos africanos, cada um pode se dizer um afro-descendente. Trata-se de uma decisão política. Se um garoto, aparentemente branco, declara-se como negro e reivindicar seus direitos, num caso relacionado com as cotas, não há como contestar. O único jeito é submeter essa pessoa a um teste de DNA. Porém, isso não é aconselhável, porque, seguindo por tal caminho, todos os brasileiros deverão fazer testes. E o mesmo sucederia com afro-descendentes que têm marcadores genéticos europeus, porque muitos de nossos mestiços são euro-descendentes.

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Munanga, K. (2004). A difícil tarefa de definir quem é negro no Brasil. Estudos Avançados, 18(50), 51–66. https://doi.org/10.1590/s0103-40142004000100005

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