A realidade brasileira tem sido analisada sob a ótica de diversas áreas do conhecimento. Desde abordagens an-tropológicas até políticas, passando pelo enfoque econômico e sociológico, temos vários retratos do Brasil. A multiplicidade de interpretações nos fornece o arcabouço de um país híbrido e complexo que, por vezes, apre-senta-se imerso nas próprias ambigüidades da sua formação histórica. Nesse sentido, a obra de Belmiro Valver-de lança outro olhar sobre o Brasil, desta vez, do ponto de vista da administração. Partindo do pressuposto de que, na experiência brasileira, o Estado precedeu a sociedade, deixando-a numa po-sição de obediência e submissão, o autor analisa seus desdobramentos e aponta suas conseqüências para a con-juntura brasileira. Assim, a força política do Estado não foi canalizada para o desenvolvimento eqüitativo da sociedade, mas foi um catalisador das desigualdades sociais. Práticas como formalismo, clientelismo, patrimo-nialismo, improvisação e imediatismo encontraram terreno fértil para desenvolverem-se e caracterizarem o mo-dus operandi de uma máquina estatal que, em última análise, administra os rumos da sociedade. O esforço do autor é no sentido de apresentar um modelo de análise que possibilite o entendimento da nossa realidade por meio da administração pública e suas nuanças no desenvolvimento social brasileiro. Para tanto, a discussão está dividida em três partes ao longo dos 12 capítulos que compõem o livro. A primeira parte apresenta uma rica discussão sobre a herança lusitana de respeito reverencial pelo Estado, do fascínio pela proximidade do poder e da posição ambivalente diante do lucro. Essas características, ao longo de 500 anos, forjaram uma maneira mimética de estruturar nossas instituições. Destaca também a interação forma-lismo/jeitinho como forma de representar o espectro das relações da sociedade com o Estado. O culto da pesso-alidade − caracterizado pela valorização do individual em detrimento do coletivo − leva a uma falta de coesão social e facilita o uso de expedientes alternativos para a satisfação de interesses privados. Assim, o formalismo estabelece regras com poder de veto e negação do individual, dando primazia ao coletivo, e o jeitinho se apre-senta como uma estratégia de navegação social que visa driblar a regra (tida como meramente formal) e fazer prevalecer o interesse pessoal.
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Rosa, A. R. (2006). O Brasil não é para amadores: estado, governo e burocracia na terra do jeitinho. Cadernos EBAPE.BR, 4(1), 01–02. https://doi.org/10.1590/s1679-39512006000100012
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