Cerca de 567 mil pessoas privadas de liberdade (PPL) estavam encarceradas no Brasil em maio de 2014. Responsabilidade do Estado, a assistência à saúde dessas inúmeras pessoas, oriundas, em sua maioria, de co-munidades desfavorecidas, muitas vezes com saúde precária, representa um desafio considerável. Bem como a educação e o trabalho, o acesso ao Sistema Único de Saúde (SUS) faz parte do processo de " ressocialização " anunciado como prioritário pela administração penitenciária. Como para os outros cidadãos, a saúde é um di-reito fundamental também para as PPL confinadas em prisões geralmente insalubres e superlotadas (taxa de ocupação: 170%), um ambiente propício à difusão de doenças como a tuberculose (TB). Como tem sido frequentemente assinalado, a saúde carcerária está em crise. Para responder a essa situação, recentemente foi lançada a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional (PNAISP), que institui, entre outras medidas, a transferência da responsabilidade pela saúde das PPL dos Estados para os municípios onde ficam localizadas as prisões. Dessa forma, muitos municípios deverão brevemente absorver esse componente carcerário. Essa nova situação pode ser uma oportunidade para que os profissionais que vão reorganizar o sistema de saúde prisional possam refletir sobre as especificidades desse contexto. Em particular, as dificuldades de acesso às ações e serviços de saúde que não se limitam às barreiras impostas pelas grades e pela reduzida mobilidade dos detentos. Elas se referem também à concepção de saúde como um privilégio e não como um direito, à sua utilização como moeda de troca, à hierarquização dos riscos à vida e à saúde nesse ambiente violento que envolve conflitos e tensões entre os diferentes atores sociais que integram a vida nas prisões. A falta de informação e o medo do preconceito e da estigmatização incidem sobre o problema, tornando complexa a busca pelo servi-ço de saúde e a adesão ao tratamento. A restrição da autonomia das PPL limita sua participação nas ações de prevenção. Os agentes penitenciários (APs), sem informação, sentindo-se descompromissados com as ações de saúde e não se vendo beneficiados por seu trabalho, acabam por dificultar o acesso aos serviços de saúde, realizando triagens informais, muitas vezes baseadas no mérito, na disciplina e na segurança. Os profissionais de saúde, mal remunerados, com contratos de trabalho precários, são sobrecarregados e isolados nas unidades prisionais com limitadas ferramentas para diagnóstico e tratamento dos doentes e exercem suas funções no limite da ética profissional. Nesse contexto, as ações de prevenção e de promoção da saúde são negligenciadas em favor de práticas prescritivas e biomédicas.
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Castro, V. D. de, Sánchez, A., & Larouzé, B. (2014). Para uma abordagem comunitária da saúde penitenciária. Cadernos Saúde Coletiva, 22(2), 111–112. https://doi.org/10.1590/1414-462x201400020001
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