O texto de Maio e Santos têm dois objetivos explícitos. Primeiro, o de criticar o modo como a UnB desenhou a sua política de cotas para a admissão de negros, recorrendo ao expediente de fotografar os candidatos que se declararam negros e posteriormente submetendo as suas fotografias a uma comissão que, em caso de dúvida, entrevistava-os. Segundo, o fato de que antropólogos tenham participado de tal comissão, com a pretensão de deterem um saber especializado sobre quem é e quem não é negro. Acho que Maio e Santos atingiram os seus objetivos, argumentando convincentemente de que tanto o procedimento adotado pela UnB quanto a pretensão de uma identificação científica de pertença grupal são equívocos que ferem, seja a Convenção Internacional sobre o racismo, sejam os cânones das ciências sociais e biológicas, impingindo constrangimento aos candidatos, além de os transformarem em alvos fáceis de discriminação. Nada tenho a acrescentar sobre esses dois aspectos. Quero deter-me, entretanto, sobre a estratégia discursiva adotada pelos autores. Apesar de em nenhum momento se manifestarem a favor ou contra a política de cotas em si, ou as políticas de ação afirmativa dirigidas à população negra brasileira, em geral, o texto que assinam acaba por sugerir que o vestibular da UnB representa um caso exemplar da política de cotas que vem sendo implementada em diferentes universidades brasileiras. Ao sugerir que o caso da UnB é o resultado mais bem acabado de uma política racialista equivocada, que toma uma característica física (a cor) ou um conjunto de características físicas ("a raça") como marcadores de pertença grupal, os autores parecem sugerir que a política de cotas para negros nas universidades brasileiras é, toda ela, equivocada. Ora, isso não me parece ser verdade. Apesar de todas elas terem estabelecido cotas de admissão para "negros", apenas a UnB entendeu por "negros" os portadores de características físicas objetivas, sujeitas a serem comprovadas por investigação administrativa, criminal ou científica. Mais ainda, na maioria das
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Guimarães, A. S. A. (2005). Entre o medo de fraudes e o fantasma das raças. Horizontes Antropológicos, 11(23), 215–217. https://doi.org/10.1590/s0104-71832005000100012
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