Introdução Pacientes esquizofrênicos demonstram alterações no desem-penho em uma grande variedade de testes neuropsicológicos. Estima-se que déficits cognitivos podem ser identificados em 40% a 60% dos indivíduos acometidos por essa condição psi-quiátrica. Vários estudos clínicos sugerem que alterações cog-nitivas podem ser observadas desde o início dos sintomas da esquizofrenia. Essas alterações parecem ser características re-lativamente estáveis na maioria dos pacientes esquizofrênicos, com pequena progressão ao longo do curso da doença. Ainda assim, alguns autores defendem o argumento de que esses dé-ficits cognitivos podem evoluir para um franco processo de-mencial, pelo menos em certos subgrupos de indivíduos aco-metidos por essa condição clínica. 1 Ainda que haja pouca discordância em relação à existência dessas alterações em pacientes esquizofrênicos, não existe unanimidade em relação aos aspectos qualitativos e quantitati-vos desses déficits. Uma das principais dificuldades nesse sen-tido é determinada pela grande variabilidade de abordagens metodológicas e conceituais empregadas na investigação des-sas alterações. Diferenças em relação à escolha dos grupos de amostragem, instrumentos de avaliação e interpretação dos re-sultados conduzem freqüentemente a conclusões conflitantes sobre esse assunto. Alguns autores defendem o argumento de que as alterações do desempenho cognitivo observadas na esquizofrenia têm ca-racterísticas compatíveis com um padrão de "déficit generaliza-do", semelhante àquele observado em processos patológicos difusos do SNC (por exemplo, intoxicação por metais pesados, hipoxia cerebral). Esse tipo de argumentação baseia-se principal-mente em determinados aspectos do funcionamento cognitivo de indivíduos afetados por essa condição clínica, como tendên-cia à imprecisão, ineficiência e alentecimento das respostas a uma grande variedade de testes neuropsicológicos. 2 Entretanto, a maioria dos estudos clínicos e experimentais sugere que pacientes esquizofrênicos apresentam alterações mais pronunciadas em relação a determinados setores do funci-onamento cognitivo. Os processos de atenção e memória, as-sim como as chamadas "funções executivas", parecem ser afe-tados de forma diferenciada em grande parte dos indivíduos acometidos pela doença. 3 Além disso, pacientes esquizofrêni-cos tendem a apresentar resultados mais baixos do que a popu-lação em geral em baterias de testes psicométricos voltadas à avaliação do quociente de inteligência. 4 Também são descritas alterações da coordenação motora simples e complexa, além de déficits de linguagem expressiva e receptiva, em indivíduos esquizofrênicos, ainda que essas alterações sejam freqüente-mente consideradas secundárias às alterações de atenção, de memória e de funções executivas. 3 Quociente de inteligência Atualmente, o quociente de inteligência é avaliado pela utili-zação de extensas baterias de testes psicométricos, como a es-cala WAIS-R (Wechsler Adult Intelligence Scale-Revised). 4 Essas escalas de avaliação são constituídas por diferentes subtestes, voltados ao exame de processos cognitivos, tais como nível geral de informação, pensamento lógico e abstrato, habilidades verbais e aritméticas, capacidades visoespaciais e viso-construcionais, atenção, memória e destreza psicomotora. No entanto, os resultados dessas escalas devem ser interpreta-dos com cautela, em função das variáveis envolvidas na reali-zação dos diferentes subtestes. Fatores como nível de instru-ção formal, faixa etária, presença de doença física ou psiquiátri-ca e utilização de drogas psicoativas podem interferir no de-sempenho em vários subtestes cognitivos, alterando de manei-ra significativa o índice final do quociente de inteligência. 3,4 Estudos clínicos demonstram que o índice do quociente de inteligência pré-mórbido de pacientes esquizofrênicos tende a situar-se em níveis mais baixos do que o de seus parentes em primeiro grau e indivíduos da mesma idade, nível de instrução formal e classe social. O quociente de inteligência pré-mórbido é avaliado por testes padronizados de leitura, como o Nart (National Adult Reading Test), ainda que uma estimativa desse índice também leve em consideração o grau de funcionamento ocupacional anterior ao aparecimento da doença. 4 A utilização de testes de leitura como instrumentos de avaliação do QI pré-mórbido baseia-se na premissa de que a maioria dos pacientes esquizofrênicos apresenta capacidades de linguagem relativa-mente preservadas, em contraste com as habilidades não-ver-bais, que parecem ser mais vulneráveis aos efeitos da doença. 4 O quociente de inteligência corrente (atual) também é objeto de investigação. Goldberg et al 5 realizaram um estudo de avali-ação neuropsicológica em pares de gêmeos idênticos discor-dantes para a esquizofrenia. Esse estudo demonstrou que indi-víduos afetados pela doença tendem a apresentar resultados significativamente mais pobres em testes de inteligência do que seus irmãos não afetados, de 80% a 95% dos casos. Uma das possíveis implicações desses resultados é que a esquizofrenia
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Adad, M. A., Castro, R. de, & Mattos, P. (2000). Aspectos neuropsicológicos da esquizofrenia. Revista Brasileira de Psiquiatria, 22(suppl 1), 31–34. https://doi.org/10.1590/s1516-44462000000500011
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