Consentimento sem consentimento: a teoria e a prática da democracia

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Abstract

DEMOCRÁTICA decente deveria ser baseada no princípio do consentimento dos governados. Essa idéia ganhou aceitação geral, mas pode ser contestada tanto por ser muito forte quanto por ser muito fraca. Muito forte, porque sugere que as pessoas devem ser governadas e controladas. Muito fraca, porque mesmo os governadores mais brutais precisam, em certa me-dida, do consentimento dos governados, e geralmente o obtêm não apenas à força. Estou interessado aqui em como as sociedades mais livres e mais democrá-ticas têm tratado tais problemas. Durante anos as forças populares têm procura-do obter uma fatia maior na administração de seus interesses, com algum sucesso ao lado de muitas derrotas. Entretanto, desenvolveu-se um corpo instrutivo de pensamento para justificar a resistência da elite à democracia. Aqueles que espe-ram entender o passado e moldar o futuro bem fariam em prestar cuidadosa atenção não somente à prática mas também à moldura doutrinal que a escora Essas questões foram tratados há 250 anos por David Hume (1) em obra considerada clássica. Hume estava intrigado com "a facilidade com que os mui-tos são governados pelos poucos e a submissão implícita com que os homens cedem os seus destinos aos seus governantes". Achava tal fato surpreendente, pois "a força sempre está do lado dos governados". Se as pessoas se dessem conta disso, sublevar-se-iam e derrubariam seus governantes. Chegou à conclusão de que o governo está baseado no controle de opinião, um princípio que "se esten-de aos governos mais déspotas e à maioria dos governos militares, bem como aos mais livres e mais populares". Hume certamente subestimou a eficácia da força bruta. A versão mais pre-cisa é que, quanto mais livre e popular um governo, mais se torna necessário contar com o controle de opinião para assegurar a submissão dos governados aos governantes. Admite-se, pelo espectro, que o povo deve se submeter. Numa democra-cia, os governados têm o direito de consentir, mas nada mais além disso. Na terminologia do pensamento progressista moderno, a população é de espectado-res, e não de participantes, à exceção de escolhas ocasionais feitas entre os líderes que representam o poder autêntico. Assim é a arena política. A população deve ser inteiramente excluída da arena econômica, na qual em grande parte se deter-NOAM CHOMSKY U

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Chomsky, N. (1997). Consentimento sem consentimento: a teoria e a prática da democracia. Estudos Avançados, 11(29), 259–276. https://doi.org/10.1590/s0103-40141997000100014

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