Apesar do vasto coro que a sustenta, o debate público sobre a descrimi- nalização do aborto caminha a passos lentos. A principal força contrária é moral, uma sobreposição de crenças religiosas e filosóficas à ordem jurídica democrática. A recente decisão do Supremo Tribunal Federal de autorizar o aborto em caso de anencefalia no feto foi uma solitária alteração legal em mais de 70 anos de Código Penal. Há projetos de lei no Congresso Nacional que propõem a criminalização irrestrita do aborto - inclusive em caso de risco de morte para as mulheres ou de estupro. O aborto legal e seguro é uma necessidade de saúde não satisfeita. As mulheres morrem, adoecem, sofrem física e psiquicamente pelo aborto realizado em condições inseguras e ilegais. Esse quadro perverso de consequências à saúde deve ser comprovado por estudos que explorem diferentes facetas da ilegalidade do aborto na vida das mulheres. Essa foi a tarefa conjunta das pesquisadoras... Mas há desafios à pesquisa sobre aborto no Brasil. A ilegalidade faz com que as mulheres temam falar de suas histórias. O estigma do crime contribui para uma atenção de baixa qualidade as mulheres com abortamento e intimida profissionais de saúde que atuam em serviços de aborto legal. Há um silêncio que emudece mulheres e profissionais de saúde. A insegurança acompanha as pesquisadoras em todas as etapas da pesquisa de campo - como proteger as mulheres, como garantir sigilo sobre suas histórias, como protegê-las do risco de uma investigação policial são dimensões novas e inquietantes para as equipes de pesquisa. Esse contexto de risco e proibição vem exigindo saídas criativas e novas metodologias para a pesquisa sobre o aborto. A magnitude do aborto ilegal e inseguro desafia as pesquisadoras em saúde pública a enfrentar a controvérsia política pelo uso da pesquisa acadêmica. Não devemos esperar que o dilema moral do aborto seja solucionado por um pacto moral razoável sobre crenças tão diversas. Nossos esforços argumentativos devem estar na produção de evidências científicas que demonstrem as consequências para a vida e a saúde das mulheres em criminalizar o aborto.
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Diniz, D., & Menezes, G. (2012). Aborto: saúde das mulheres. Ciência & Saúde Coletiva, 17(7), 1668–1668. https://doi.org/10.1590/s1413-81232012000700001
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