Educação para a formação "comum" do homem Na análise da situação educacional brasileira, desejaria evitar toda tendenciosidade, e mostrar, tão imparcial e objetivamente quanto possível, o desenvolvimento da escola brasileira à luz dos conceitos e das forças que nela atuaram. Tratando-se de instituição que corporifica idéias e aspirações sociais, é imprescindível certa precisão em caracterizar tais conceitos e ideais, a fim de evitar as inúteis e estéreis confusões, tão comuns em nossas controvérsias, nas quais diferenças de pontos de partida e diferenças de conceituação geralmente impedem qualquer entendimento comum do problema e, portanto, qualquer progresso útil no esclarecimento da solução aceitável pelos participantes do debate. Preliminar indispensável à fixação de um ponto de partida comum é o exame da educação escolar antes de se estabelecerem as aspirações modernas da escola universal para todos, proclamadas, tão ruidosamente, na Convenção Revolucionária Francesa, como um novo estágio da humanidade. Antes desse período, toda educação escolar consistia na especialização de alguém, cuja formação já fora feita pela sociedade e em rigor pela "classe" a que pertencia, nas artes escolares, que mais não eram que tipos especiais de ofícios intelectuais e sociais. A sociedade formava os homens nas próprias matrizes estáveis das "classes" senão "castas", instituições que incorporavam a família e a religião, com as suas forças modeladoras e adaptadoras. Formado assim o homem, as aprendizagens mais específicas, relacionadas com o trabalho, se faziam pela participação direta na vida comum, ou, no caso de artesanato, pelo regime do mestre e aprendiz no ateliers e oficinas da época. A escola e a universidade eram, apenas, aspectos mais amplos dessa especialização do artesanato, com mestres e alunos vivendo em comum, nas corporações universitárias, em regime de aprendizagem associada das pequenas e grandes artes intelectuais. Quando, na Convenção Francesa, se formulou o ideal de uma educação escolar para todos os cidadãos, não se pensava tanto em universalizar a escola existente, mas em uma nova concepção de sociedade, em que privilégios de classe, de dinheiro e de herança não existissem, e o indivíduo pudesse buscar, pela escola, a sua posição na vida social. Desde o começo, pois, a escola universal era algo de novo e, na realidade uma instituição independente da família, da classe e da religião, destinada a dar a cada indivíduo a oportunidade de ser, na sociedade, aquilo que seus dotes inatos, devidamente desenvolvidos, determinassem. Desse modo, a educação escolar passou a visar-não a especialização de alguns indivíduos, mas a formação comum do homem e a sua posterior especialização para os diferentes quadros de ocupações, em uma sociedade moderna e democrática. Há, antes de tudo, uma transformação radical com a criação da nova escola comum para todos, em que a criança de todas as posições sociais iria formar a sua inteligência, a sua vontade e o seu caráter, os hábitos de pensar, de agir e de conviver socialmente. Essa escola formava a inteligência, mas não formava o intelectual. O intelectual seria das especialidades de que a educação posterior iria cuidar, mas não constitui objeto dessa escola de formação comum a ser, então, inaugurada. Por outro lado, além dessa total inovação, que representava a escola para todos, a própria educação escolar tradicional e ainda existente teria de se
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Davis, H. E. (1958). Educação não é privilégio. Hispanic American Historical Review, 38(2), 311–311. https://doi.org/10.1215/00182168-38.2.311
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