Em "A questão da técnica", Heidegger pretende interrogar a técnica acerca de sua própria essência. Nessa interrogação, a técnica será tomada como questão, o que já antecipadamente elimina algumas possibilidades, tais como investigação e definição. Com efeito, a técnica não será tomada como objeto cuja investigação nos levaria possi-velmente a uma essência; tampouco a técnica será submetida a um processo de conhe-cimento objetivo ao cabo do qual se poderia defini-la. Em outras palavras, não se pre-tende chegar a qualquer resultado que forneça uma representação da técnica. O que será feito só se pode enunciar, a princípio, negativamente: trata-se de afastar algumas con-cepções habituais que se consolidaram como visões da técnica, para com isso liberar a sua essência. Isso não significa que, com esse procedimento, nos apropriaremos da essência da técnica; apenas nos colocaremos na posição em que seria possível pensá-la eventualmente para além das dimensões metafísica e epistemológica. Isso se faz necessário para que possamos superar um viés exclusivamente humanista segundo o qual a técnica tem sido representada. Nesse sentido, cabe de início explorar criticamente a concepção da técnica como agenciamento de meios para a consecução de fins, o que é feito a partir de uma elucidação do sentido grego daquilo que herdamos como a teoria causal. Entendemos normal-mente as quatro causas definidas por Aristóteles como possuindo um sentido operatório, razão pela qual a ênfase recai sempre sobre a causa eficiente, que estaria mais propri-amente ligada à efetuação ou produção de efeitos. Assim se constrói uma determina-ção instrumental da causalidade. Ora, a compreensão heidegeriana, a partir do signi-ficado propriamente grego de causa, caminha em uma outra direção, em que a relação operatória de efetuação é substituída pela de comprometimento. As quatro causas devem ser vistas como comprometimento com a produção da coisa. Assim, quando digo que a causa material corresponde à matéria de que algo é feito, o que se quer dizer na verdade é que há uma espécie de compromisso entre uma certa matéria e a produção do objeto; quando falo em causa final, quero dizer que há uma espécie de compromisso entre a produção da coisa e a finalidade a que deverá servir. Com isso supera-se a idéia de que se trata apenas de fazer algo, a partir de alguma coisa, para um certo fim. Na articulação scientiae zudia, São Paulo, v. 5, n. 3, p. 369-74, 2007 documentos científicos 369
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Silva, F. L. e. (2007). Martin Heidegger e a técnica. Scientiae Studia, 5(3), 369–374. https://doi.org/10.1590/s1678-31662007000300005
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