Muitos trabalhos recentes acerca da violência sugerem que, quando se contempla a violência, atinge-se uma espécie de limite da capacidade de representar. Em geral apresentados sob o signo do " horror " , eles nos fazem pensar como seres huma-nos podem ter sido capazes de atos tão hediondos, em tão grande escala, como em Ruanda ou na ex-Iugoslávia. A violência da Partição da Índia, em 1947, fornece um tropo de horror comparável na historiografia da Índia. Parece que entendemos tais atos como chocantes e inimagináveis apenas quan-do temos uma idéia formada acerca de como o sujeito humano deva ser construído. Essas descri-ções servem, assim, para reafirmar as fronteiras entre civilizado e selvagem, e também permitem que nossa imagem do sujeito humano permaneça intacta. Em contraste com essa plenitude de fala, gostaria de apresentar um retrato de pobreza, especialmente de pobreza de palavras, e refletir acerca dessa pobreza como uma virtude. Pode-se dizer da Antropologia o que Lefebvre (1968) disse da Filosofia: " O papel do pensamento filosófico é eliminar explicações prematuras, posições limita-doras que possam nos impedir de penetrar e apreender o conteúdo formidável de nosso ser. " Essa imagem da contenção também lembra, para mim, a concepção de Stanley Cavell (1989) da Filosofia, como a que não fala primeiro e cuja virtude reside na capacidade de resposta: incansá-vel, alerta, quando outros já adormeceram. A imagem do estado de alerta na ocorrência da violência, da capacidade de resposta onde quer que ocorra na teia da vida, nos leva a perguntar se os atos de violência são transparentes. Como se pode expressar a relação entre a possibilidade e a ocorrência, e mais ainda, entre o factual e o eventual, se a violência, quando acontece de modo
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Das, V. (1999). Fronteiras, violência e o trabalho do tempo: alguns temas wittgensteinianos. Revista Brasileira de Ciências Sociais, 14(40). https://doi.org/10.1590/s0102-69091999000200003
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