Até os dias de hoje, as discussões teóricas sobre a moral são determinadas pelo confronto entre três posições: as argumentações transcorrem entre Aristó-teles, Kant e o utilitarismo. Apenas as éticas da compaixão fazem valer um mo-tivo diverso. Outras teorias, mesmo a hegeliana, podem ser entendidas como tentativas de síntese de iniciativas conhecidas. A ética do discurso (Diskurse-thik), que se põe como tarefa salientar o conteúdo normativo de um uso lin-güístico orientado para a compreensão, não é a referida síntese. Ao tentar de-monstrar, com os meios da análise da linguagem, que o ponto de vista do jul-gamento imparcial de questões prático-morais — o ponto de vista moral — surge em geral dos pressupostos pragmáticos inevitáveis da argumentação, ela se filia à tradição fundada pela Crítica da razão prática. Com essa tomada de partido em favor de Kant, ela não adota, porém, aquelas premissas que forçam a res-saltar unilateralmente a iniciativa deontológica, ou seja, excluindo as intuições nas quais, com um certo direito, se concentram as iniciativas concorrentes. No que se segue, importa para mim o direito relativo daqueles três aspectos sob os quais podemos fazer um uso, a cada momento diferençado, da razão prática. Gostaria de mostrar isso pela via de uma análise dos tipos de argumentação a eles correspondentes. Assim como a ética moderna, a ética clássica parte da questão que se põe ao indivíduo que precisa de orientação, quando ele, numa situação determinada, encontra-se diante de uma tarefa a ser vencida de maneira prática: como devo comportar-me, que devo fazer? Esse "dever" (Sollen) guarda um sentido não-específico enquanto o respectivo problema e o aspecto sob o qual deve ser so-lucionado não sejam determinados mais de perto. Antes de tudo, gostaria de di-ferençar o uso da razão prática tendo como fio condutor os modos pragmático, ético e moral de pôr a questão. Sob os aspectos daquilo que é adequado a fins (Zwechnässiges), do bom e do justo, esperam-se, respectivamente, desempe-nhos diferentes da razão prática. De acordo com eles, altera-se a constelação entre razão e vontade nos discursos pragmáticos, éticos e morais. A formação da vontade individual encontra, por fim, seus limites no fato de abstrair da rea-lidade da vontade alheia. Com os problemas fundamentais de uma formação ra-cional da vontade coletiva entram em jogo os modos de pôr a questão a partir de uma teoria normativa do direito e da política. Texto apresentado na Conferência do Mês (IEA/USP): "Zum pragmatischen, ethischen und moralise hen Gebrauch der praktischen Vernunft", realizada em outubro de 1989.
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Habermas, J. (1989). Para o uso pragmático, ético e moral da razão prática. Estudos Avançados, 3(7), 4–19. https://doi.org/10.1590/s0103-40141989000300002
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