O conhecimento bioestratigráfico do Mesozóico-Cenozóico das bacias sedimentares brasileiras relaciona-se estreitamente com o entendimento da evolução geológica da margem continental, o qual por sua vez, condicionou os caminhos e avanços da exploração petrolífera no país, nos últimos 50 anos. A exploração petrolífera em bacias brasileiras ganhou forte impulso na década de 1950, com as descobertas pioneiras em bacias terrestres (Recôncavo, Tucano, Sergipe-Alagoas e Espírito Santo), inicialmente confinadas em contextos tectono-sedimentares típicos de riftes. Nestascalhas deposicionais, formadas na separação dos no eocretáceo) e inicialmente preenchidas com sedimentação essencialmente continental lacustrefluvial, acabamos por reconhecer e aprender a utilizaros primeiros grupos de microfósseis importantes do ponto de vista bioestratigráfico: os ostracodes e os palinomorfos. Do final de 1950 a meados de 1960 desenvolveram-se importantes trabalhos sobre asdiversificadas e abundantes faunas de ostracodes não-marinhos das seções riftes brasileiras, faunas estas que, seguramente, não têm registro paralelo em bacias rifte do mundo inteiro (Krömmelbein,1962; Vianna, 1966). A resolução bioestratigráfica por ostracodes em seções riftes continentais brasileiras é excelente e, a despeito do caráter upostamente endêmico destes microorganismos, é possível correlacionarmos os diferentes arcabouços biocronoestratigráficos do eocretáceo entre bacias tão distantes quanto o Recôncavo e Potiguar, ou e Sergipe-Alagoas (relatório interno de Picarelli et al., 1993). Paralelamente, evoluiram os estudos de palinomorfos continentais (miósporos ou grãos de pólen e esporos), os quais, do ponto devista qualitativo (eventos de surgimento e extinção), não oferecem o refinamento bioestratigráfico alcançado pelos ostracodes.Entretanto, as análises permitiram, desde meados de 1950, correlações geológicas regionaisseguras para a sedimentação nas diferentes fases ecompartimentos tectônicos do preenchimento dos riftes, do Recôncavo à bacia do Parnaíba (Müller,1966; Picarelli et al., 1993).Na década de 1960 nacionalizou-se aexploração brasileira, que, mais ousada, partiu parainvestigar as porções submersas das bacias costeiras,em águas rasas das bacias de Barreirinhas a Pelotas (histórico em Mendonça et al., 2004). Seções transicionais e marinhas, depositadas nas fases de forte subsidência térmica e deriva da margem continental, começaram a ser perfuradas nas bacias de Sergipe e Espírito Santo, revelando uma espessa e complexa sedimentação marinha que demandaria a capacitação e formação de especialistas em outros métodos micropaleontológicos. Iniciam-se os estudos dos nanofósseis calcários, que se revelariam fundamentais na exploração de seções marinhas nas décadas seguintes. Outro importante método deinvestigação marinha, os foraminíferos, já era de uso corrente na exploração de seções marinhas de poços terrestres, como por exemplo, nas bacias de Sergipe- Alagoas. Os zoneamentos bioestratigráficos pioneiros destas bacias, tanto para o Paleozóico quanto parao Mesozóico-Cenozóico, foram desenvolvidos ao longo de 1960 e compilados por Schaller (1969).A intensa perfuração de poços em águas rasas da plataforma continental, no final de 1960 e ao longoda década de 1970, resultou no estabelecimento de arcabouços biocronoestratigráficos completos (seções rifte, transicional e marinha) das bacias marginais brasileiras, de Campos a Barreirinhas (Troelsen & Quadros, 1971; Noguti & Santos, 1972; Regali et al.,1974). A integração dos quatro principais métodos então implantados – ostracodes não marinhos, palinomorfos, nanofósseis e foraminíferos – fornecia um refinamento bioestratigráfico plenamente compatível com a resolução de levantamentos sísmicos bidimensionais (2D) então existentes. Os principais arcabouços biocronoestratigráficosbrasileiros, do neojurássico/eocretáceo ao Terciário, foram formalizados ao final da década de 1980 (e.g. Azevedo et al., 1987; Viviers & Regali, 1987; Beurlen & Regali, 1987). Os anos 1980 foram marcados pela realização de diversos projetos de integraçãoestratigráfica e pela intensa divulgação da produção técnica da área de bioestratigrafia da Petrobras. Como um marco técnico-científico desta década, destaca-se o I Simpósio de Evolução do AtlânticoSul, realizado em 1985 (IX Congresso Brasileiro de Paleontologia) e cujos principais resultados foram publicados na Revista Brasileira de Geociências, em 1987. No início da década de 1990, os arcabouçosbiocronoestratigráficos foram organizados por bacias em um relatório interno da Petrobras (Beurlen et al., 1992), o qual serviu de base para a publicação hoje clássica das Cartas Estratigráficas das baciasbrasileiras no Boletim de Geociências da Petrobras, em 1995.No final dos anos 1980, a exploração, auxiliada pela sísmica 3D, e as descobertas em depósitos turbidíticos terciários de águasprofundas da margem continental conduziram a um aperfeiçoamento das técnicas bioestratigráficas, incluindo a informatização, uniformização e o início do tratamento das extensas bases de dados. A bioestratigrafia era então rotineiramente complementada pelos estudos paleoecológicos de foraminíferos bentônicos, fundamentais para a exploração e explotação em águas profundas. A concentração de novos plays em seções marinhas do neocretáceo e Terciário impulsionaram os estudos de dinoflagelados (palinomorfos marinhos), ferramenta que se tornaria operacional na década de 1990 (Arai &Botelho, 1996; Lana & Roesner, 2002). Nesta década,o avanço para águas ultraprofundas, permitido pela altíssima resolução sísmica 3D, e a necessidade de desenvolvimento de reservatórios subsísmicos foiacompanhada por estudos biocronoestratigráficos de alta resolução, utilizando detalhadas informações paleobatimétricas e os nanofósseis calcários, que embasaram refinados modelos estratigráficos(Antunes, 1996; Oliveira et al., 1999). Na presente década, os desafios biocronoestratigráficos são imensos, passando pela necessidade de melhoria de resolução em seções de recuperaçãofossilífera tradicionalmente baixa, como o Albiano carbonático da margem sudeste, intervalo onde importantes acumulações de hidrocarbonetos vêm sendo descobertas, às tentativas de datações radiométricas em rochas sedimentares (isótopos de Rb/Sr) e matéria orgânica (isótopos de Re/Os), para a calibração geocronológica das biozonas brasileiras. O desenvolvimento e a implantação rotineira de novas metodologias para o Mesozóico-Cenozóico marinho, como os radiolários e ostracodes marinhos, constituem-se em outro importante desafio. Estes estudos, iniciados por técnicos da empresa (Viviers et al, 2000), estão em pleno desenvolvimento junto às universidades brasileiras, através de projetos e contratos de serviços.
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Lana, C. C., & Beurlen, G. (2007). Microbioestratigrafia do Mesozóico-Cenozóico brasileiro: um passeio pelo tempo. Anuário Do Instituto de Geociências, 30(1), 207–209. https://doi.org/10.11137/2007_1_207-209
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