A literatura comparada dedica-se ao estudo das questões identitárias e das representações literárias interétnicas ou intersociais pelo viés privilegiado das relações interculturais. Em razão de seu amplo espectro de possibilidades de interpretação literária e cultural, a literatura comparada torna-se uma producente ferramenta para a análise dos diálogos transculturais em que se manifestam a aceitação ou a recusa das diferenças. Nessa perspectiva, o presente trabalho resulta de um estudo comparativo acerca da imagem literária da exclusão social, tendo como foco precípuo o relato autobiográfico da brasileira Carolina Maria de Jesus, em sua intersecção socialmente assimétrica com a escrita do mexicano Octavio Paz e do uruguaio Eduardo Galeano. No que se refere à subjetividade autoral, a brasileira lança mão de um poder expressivo que alcança significados para além da mera representação, pois seu testemunho parte de um lugar de enunciação que é aquele do próprio excluído: o conhecimento empírico da existência de uma catadora de papel, mulher, negra, migrante, mãe, descendente de escravos no Brasil, migrante sem perspectivas de vida, chefe solitária de família, moradora em favela, ser humano privado de cidadania. Nas páginas desse diário de desventuras, o testemunho existencial de Carolina traz à luz representações literárias e imagens simbólicas sobre uma importante parcela da sociedade que se encontra à margem, invisível aos demais segmentos da população. Essa parcela invisível da sociedade corresponde àqueles que Octavio Paz batiza como "ninguneados", àqueles que Eduardo Galeano homenageia com seu poema "Los nadies": seres humanos cuja existência é voluntariamente apagada ou ignorada nas manifestações culturais e nas relações sociais que conformam as hierarquias cotidianas e os modos de experiência de vida. Em próprio conhecimento de causa, Carolina corporifica uma voz autoral poeticamente expressiva que traz a lume a vida e a história silenciadas dos que se encontram à margem, por mais que sejam parte integrante da história de seu povo e do conjunto da humanidade.The Comparative Literature is aimed at approaching cultural identity matters as well as interethnic or intersocial literary representations. Through its wide range of possible literary and cultural readings, the Comparative Literature becomes a useful tool to analyze transcultural dialogues as a locus of refusals or acceptations for human and social differences. Henceforth, this paper results of a comparative reading focused on Carolina Maria de Jesus autobiographical narrative and its implicit social exclusion literary images. In order to achieve that critical goal, this crisscrossed-reading takes into consideration the poetic and social ideas of Mexican diplomat Octavio Paz and Uruguayan journalist Eduardo Galeano. The selected text corpus brings forth literary representations and symbolic images of the society segment that lives in an extreme marginal position, making themselves invisible to other social groups. These out-of-sight people are called "ninguneados" by Octavio Paz, while Galeano pays a tribute to them in a denouncing poem that presents, from an external point of view, some aspects of their silenced life. Those people are the very human beings whose existence is voluntarily erased or ignored within every cultural manifestations or social relationships that configure hierarchical daily life as well as empirical ways of social living. From an internal point of view, Carolina de Jesus brings into light the silenced life and history of those people condemned to live as outsiders in modern social structures, despite their full belonging to their own people history as well as to the whole humankind history.
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Tirloni, L. P., & Marinho, M. (2014). Carolina Maria de Jesus e a autorrepresentação literária da exclusão social na América Latina: olhares reversos aos de Eduardo Galeano e Octavio Paz. Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea, (44), 249–270. https://doi.org/10.1590/2316-40184411
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